sexta-feira, 15 de janeiro de 2010




carta a um desconhecido.





é provável que você questione o sentido destas linhas ao lê-las. na verdade, até eu o faço pois, por sermos estranhos um ao outro, o significado das palavras tende a pesar mais em mim, visto que para você elas foram vazias até agora.

se buscas em mim o preenchimento para tua carência sentimental ou até mesmo carnal, sinto dizer-te que estás enganado de endereço.

por detrás dessa fortaleza (que vê à minha frente) mora uma intensidade profunda cuja fragilidade é muito valiosa para ser exposta a um aventureiro qualquer. no entanto, cumprimento – lhe por sua determinação (ou seria ‘curiosa insistência’ apenas?), chegar aqui não é fácil e, de certa forma, você abriu algumas portas... mas, como a maioria, contentou-se com isso apenas – entrar. (quantos entram e não ficam... tornam-se indesejáveis.) esqueceu-se do labirinto no jardim e acabou se perdendo nele... esqueceu-se dos inúmeros quartos e das escadarias que servem para enganar os desatentos e proteger a torre principal... esqueceu-se. ou então acovardou-se. ou então contentou-se.
a torre abriga a pureza, a magia, a flor. sim, a flor! a flor que exala o perfume que te encantou... sábio protetor, o encanto lhe enganou fazendo-o achar que era ele a melhor parte quando, na verdade, ela está na flor, no nascedouro do esplendor.
a flor será entregue ao bravo que interessar-se por ela e assim empenhar-se em descobri-la, ao bravo que aprender fazê-la desabrochar.

se a superficialidade do beijo desapaixonado e do abraço desinteressado te basta, não és digno de ter a flor, de poder chamá-la “MINHA flor”.

uma flor sabe que seu perfume e sua cor embelezam e alegram os dias de quem a contempla. uma flor conhece seu valor próprio, seu valor único, sua individualidade e, por valorizar-se, seleciona os olhos que poderão vê-la, as mãos que poderão tocá-la, a vida que por ela será colorida.

se o encanto da flor basta, e não ela por inteiro, não és digno de contemplar a plenitude dela. se a comodidade do costume da companhia é suficiente, és covarde.

a covardia não merece a vida. a vida merece (e pede) coragem. a coragem é amiga do interesse; o interesse caminha com o empenho; o empenho é visto com a atitude; a atitude precisa da sensibilidade, que é a chave para a escadaria principal - a escadaria que leva à torre. só quem procura entender a grandiosidade que um detalhe possui consegue ser grande.

se não tens sensibilidade para imaginar como é ver através dos olhos da flor, não conseguirás valorizar as cores como ela. se, com a flor na mão, não vires o brilho do sol com a mesma importância com que ela o vê (ou ao menos aproximar-te disso), não entenderás que todo esforço é vão quando o combustível para a vida é diferente.


Julga-se ainda apto a prosseguir nessa aventura?

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010




não acredito que sentimentos sejam egoístas. não acho a raiva egoísta; não acho a dor egoísta. acho que eles são incompreensíveis – só quem as sente sabe o quanto incomodam. Camões foi feliz em dizer que a dor deve ficar escondida no peito, em dizer “ a dor que minha alma sente/ de mim só seja chorada/ de ninguém seja sentida/ .../ não na saiba toda gente.”
por melhores que sejam as palavras escolhidas para descrever algo que me magoa, não conseguirei colocar nelas a vida (ou a morte) que representam para mim. eu posso querer compartilhar, dividir a dor... mas a divisão será sempre desigual – eu carregarei o peso maior, e só eu poderei decidir o que fazer com ele. acredite – sofrer sozinha não é egoísmo, é a única outra opção que me resta diante da incompreensão, que seria o outro caminho, e que certamente, ridicularizaria o que é importante para mim.
nunca invejei a superficialidade, apesar de saber que ela simplifica quase tudo. gosto de intensidade; profundidade; complexidade. é, eu sou exatamente assim – intensa, profunda e complexa. existe em mim um complexo de sentimentos misturados na iminência de explodirem. o que restará depois da explosão não sei; só sei que certamente ficarão resíduos inflamáveis que servirão de base para uma outra ‘bomba’, e assim seguirei – explodindo, acalmando, limpando, reconstruindo, explodindo... e como esse ciclo acontece aqui dentro de mim, só eu o conheço. e não é por falta de vontade que não o explico a você, o que ocorre é que desconheço os meios para explicá-lo. o ritmo dos fatos é alterável, o que invalidaria qualquer manual.


ei, psiu! me descobre?!